Audiência pública sobre mineração no Botafogo e revisão do plano diretor de Ouro Preto

Maio 7, 2025

Audiencia publica botafogo

No dia 7 de maio de 2025, membros da Sociedade Excursionista e Espeleológica (SEE), Priscila Gambi, Tiago Vilaça Bastos (Fox) e Maria Luiza, participaram da audiência pública realizada na Câmara Municipal de Ouro Preto para debater os impactos do avanço minerário na região do Botafogo, com ênfase na atuação da empresa Patrimônio Mineração, assim como discutir diretrizes do Plano Diretor do município. A audiência contou com ampla participação de representantes da sociedade civil, comunidade científica, movimentos sociais e lideranças locais. Lamentavelmente, faltou a participação de representantes da Fundação Gorceix, entidade que está coordenado a Revisão do Plano Diretor.

Tiago Bastos, representando a SEE, destacou na audiência a importância da preservação das cavernas da região, além de apresentar o mapa de potencial espeleológico de Ouro Preto, com detalhe para a região do Botafogo, onde é classificada com de Muito Alto Potencial para ocorrências de cavidades naturais. Enfatizou a caracterização e o mapeamento da Gruta Botafogo 1, localizada dentro de um dos três polígono minerário de propriedade da BHP Billiton (uma das controladoras da Samarco), que detém ao todo cerca de 900 hectares na Serra de Ouro Preto.

A Gruta do Botafogo 1, tem aproximadamente 150 metros de desenvolvimento linear, onde dois córregos subterrâneos nascem e convergem para o córrego do Funil, que abastece a comunidade do Botafogo. A caverna abriga um fauna cavernícola rica, sendo observados colônia de morcegos, andorinhões, opiliões, grilos, aranhas, sapos, girinos e fungos, além de guano, um importantíssimo recurso para o ecossistema cavernícola. Não há estudos bioespeleológicos ainda, sendo essencial conhecer as relações ecológicas de todos esses serem, que já podem ter algum ônus devido a supressão vegetal realizado pela Mineração Patrimônio, localizada a cerca de 1km desta gruta.

Sobre a geoespeleologia, existem feições espeleológicas, como as caneluras, ainda pouco estudadas e demandam investigação científica, auxiliando a compreensão dos processos de formações das cavernas em quartzitos. Tiago também exibiu um modelo fictício da área de influência de uma cavidade, evidenciando a importância de se determinar a microbacia que a cavidade está inserida assim como a área de alimentação dos morcegos e dos andorinhões. Ao final, Tiago sugeriu a criação de uma Zona de Proteção Ambiental Municipal (ZPAM) para toda a Serra de Ouro Preto, como forma de resguardar o patrimônio natural, hídrico e espeleológico, que neste momento está ameaçado pelos projetos minerários.

A Professora Adivane Terezinha Costa, do Departamento de Geologia da UFOP, destacou a relevância hidrogeológica da área, ressaltando que Ouro Preto não precisa seguir refém de uma economia minério-dependente. Apontou a importância do turismo e ecoturismo como alternativas econômicas sustentáveis, e alertou para os riscos à recarga hídrica local, devido às nascentes ameaçadas pelos projetos minerários. A Professora Lívia Andrade, do Departamento de Biologia da UFOP, reforçou que Minas Gerais abriga uma das floras mais ricas do mundo, presente também em Ouro Preto, com trechos significativos de Mata Atlântica e de campos rupestres. Questionou a ausência de espécies ameaçadas nos estudos ambientais apresentados, denunciando a inconsistência técnica desses documentos. A Professora Ana Paula Assis de Arquitetura e Urbanismo da UFOP apresentou o Relatório de Impactos Cumulativos da Mineração Botafogo, realizado no ano de 2025 pela UFOP, considerando apenas três das sete mineradores que tem projetos no local. O estudo evidenciou a redução da zona de amortecimento feita pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) e a omissão do Estado em fiscalizar os danos oriundos da implantação e operação da Mineração Patrimônio. Abordou o conceito de minério-dependência como forma de necropolítica, defendida inclusive pelo Secretário Municipal de Meio Ambiente, e propôs alternativas econômicas baseadas na valorização dos patrimônios cultural, hídrico e natural.

Denizete de Fátima dos Santos, representante da Frente Popular em Defesa de Amarantina, fez um apelo sobre os efeitos da "servidão mineral", citando o excesso de poluição sonora e material particulado. Enfatizou que não há transparência por parte da Prefeitura assim como da Secretaria do Meio Ambiente e afirmou que "só haverá desenvolvimento ambiental se não houver mortes". Benito Silva, da Associação de Moradores e Amigos de Botafogo, denunciou o risco de contaminação dos recursos hídricos utilizados pela população e alertou para a existência de outras cavernas na área minerada, cobrando da ANM, representado na audiência pelo Sr. Stefano Antônio Lanza, a devida fiscalização do crime cometido pela supressão de uma cavidade natural subterrânea pela Mineração Patrimônio e amplamente divulgado pela mídia.

Participantes da comunidade reforçaram a importância de repensar o modelo econômico de Ouro Preto, apontando o legado de 300 anos de mineração como responsável por desigualdades históricas. Du Evangelista falou da perpetuação do colonialismo e das falhas nos estudos apresentados. Ryane questionou a ausência do prefeito Ângelo Oswaldo na audiência, cobrando respeito e diálogo com a população. Estudantes presentes também denunciaram a falta de retorno social do modelo minerário: “Com tanta mineração, por que não temos o mínimo?”. Foram mencionados o trauma transgeracional causado pelas perseguições aos que resistem e a necessidade de tombamento das nascentes do alto Rio das Velhas como patrimônio imaterial. Sidneia Francisca da Silva, historiadora e ativista, lançou a pergunta que ecoou entre todos: “Quantas vidas temos que perder para que vocês tenham respeito pelas nossas vidas?”.

A Audiência Pública escancarou a insatisfação popular diante da condução dos processos de licenciamento minerário, assim como da fiscalização, bem como a ausência de transparência por parte do poder público.

 

Ao final da audiência, foi proposta pelo presidente da sessão, vereador Kuzuru, a criação de um Grupo de Trabalho Popular para encaminhar as propostas da população, entre elas a criação de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral na Serra de Ouro Preto.

A Sociedade Excursionista e Espeleológica se posiciona firmemente em defesa da vida, da água, do patrimônio natural e cultural, e pela construção coletiva de alternativas sustentáveis para o futuro de Ouro Preto. Água, terra e caverna não são mercadorias. São territórios de vida!

Link externos:

4ª Audiência Pública de 2025: Tema: tratar sobre revisão do Plano Diretor - Mineração na localidade de Botafogo e em outras regiões de Ouro Preto. Req. Vereador Kuruzu

Texto: Priscila Gambi

Revisão: Tiago Vilaça Bastos (Fox)

Fotos: Priscila Gambi e Tiago Bastos