O Parque Nacional das Sempre Vivas (PARNA PNSV) é uma Unidade de Conservação Federal de Proteção Integral (UC), criada em 13 de dezembro de 2002. A extensão territorial do Parque se estende no extremo norte da Serra do Espinhaço Meridional (SdEM), que também integra um importante conjunto de áreas protegidas conhecidas como reservas da biosfera. Com uma área de 124.555 hectares e perímetro de cerca de 168 quilômetros, o PNSV abrange partes dos municípios de Olhos d’Água, Bocaiúva, Buenópolis e Diamantina em Minas Gerais.
O Parque é circundado por comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas, que têm por base economica atividadestem extrativistas, como os coletores de sempre vivas do povoado de Macacos e pecuaristas dos povoados de Santa Rita, Curimataí e região, deixando notório a relevância de aspecto histórico cultural integrante ao PNSV.
O nome do Parque deriva das diversas espécies das plantas do gênero Actinocephalus, conhecidas popularmente como "Sempre Vivas", que florescem naquela região. Sua área insere-se no bioma Cerrado podendo ser considerado um Complexo Rupestre de Altitude, apresentando em sua composição um mosaico diversificado de fitofisionomias florestais, savânicas e campestres com e sem a presença de afloramentos rochosos (Almeida et al., 2007). Nas formações florestais destacam-se matas ciliares e de galeria, as quais acompanham os cursos d’água da UC. Além disso, há as matas secas, que são encontradas distantes dos rios e córregos e apresentam um menor tamanho em relação às outras, ocorrendo geralmente em solos mais férteis (Ribeiro & Walter 2008).
O Parque é também um divisor de águas das bacias hidrográficas do Rio São Francisco e do Rio Jequitinhonha, com morros de até 1525 metros traçando este limite(ICMBio 2012). Para Saadi (1995) este setor da Serra assume a função de ponto irradiador das drenagens dos rios São Francisco, Doce, Jequitinhonha e Araçuaí. Tal característica faz com que toda a rede de drenagens da UC transite por seu território de dentro para fora, ou seja, todos os cursos d'água presentes no parque necessariamente nasceram no mesmo. Segundo o plano de manejo (ICMBio 2012), são cerca de 600 nascentes presentes no território no Parque, alimentando os cursos d’água da espinha dorsal hidrológica. Além dessas drenagens tributárias, ecossistemas úmidos importantes do Parque são proporcionados pelas turfeiras, funcionando como esponjas que regulam o nível freático a partir de uma vegetação que nasce em meio a um pontual estoque de carbono orgânico que, ao crescerem e exaurir-se com o tempo, acumulam grande quantidade de material vegetal morto (Pontevedra-Pombal & Martinez-Cortizas 2004), sendo o solo ao fim desse processo, propício a reter uma grande vazão de água provenientes das chuvas (Bispo 2013). De forma prática, em períodos chuvosos o solo armazena grande quantidade de água, promove o erguimento no nível freático, e nos períodos de seca drena este recurso para a superfície (INGRAM 1983).
No geral, o PNSV apresentava um baixo índice de cavidades cadastradas devido ao extenso território do Parque e à escassez de estudos de espeleologia na região. Antes da execução e finalização do presente projeto, eram reconhecidas apenas 23 cavidades, conforme os dados do Cadastro Nacional de Informações Espeleológicas (CANIE-CECAV) e do Cadastro Nacional de Cavernas (CNC-SBE). Além disso, com base no Inventário Preliminar do Patrimônio Espeleológico do Parque Nacional das Sempre Vivas, foi possível coletar informações sobre 15 cavidades já conhecidas, entre cavernas e abrigos (dos Santos, 2016), todas com pequeno desenvolvimento linear (DL), destacando-se as cavidades Lapa da Vargem do Buriti e Lapa da Saduruta, com, respectivamente, 40 e 45 metros de DL (Yoshizumi & Selos, 2024).
Com relação à ocorrência de cavidades, segundo o mapa de JANSEN et al. 2012, 93% da área do Parque apresenta médio potencial, sendo que todas as cavidades conhecidas estão inseridas neste domínio, e 5% da área apresenta alto potencial. Neste contexto, em agosto de 2019, o presente projeto denominado “CARACTERIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO ESPELEOLÓGICO DO PARQUE NACIONAL DAS SEMPRE VIVAS (MG) - PROVIVAS”foi iniciado pela Sociedade Excursionista e Espeleológica (SEE) através do Termo de Compromisso de Conservação de Cavernas (TCCE) 03/2018, firmado entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A. A execução da compensação refere-se aos impactos negativos irreversíveis as cavidades naturais subterrâneas com grau de relevância alto, ocasionados pelo empreendimento “Extensão da Mina do Sapo” (Processo SEI ICMBio nº 02667.000045/2018-11).
Os objetivos do projeto foram: Identificar elementos de relevo potenciais como indicadores espeleológicos, tais como: afloramentos, cavidades, dolinas e seus alinhamentos, uvalas, surgências, sumidouros, zonas de recarga de aqüíferos e cursos d'água; 2) Localizar, descrever e preencher ficha de caracterização de cavernas do CECAV de todas as cavidades naturais subterrâneas (abismos, cavernas, abrigos) encontradas, em prol de um melhor conhecimento e reconhecimento acerca da conservação ambiental dessa importante região; 3) Realizar croquis esquemáticos das cavidades prospectadas; 4) Realizar o mapeamento espeleológico com grau de precisão BCRA 4C de um grupo representativo de cavidades naturais subterrâneas definidas a partir dos critérios encontrados na metodologia; 5) Orientar demais estudos que envolvam cavidades naturais subterrâneas presentes no PNSV, como: estudos arqueológicos, geológicos, paleontológicos, biológicos, topográficos e turísticos; 6) Elaborar um Sistema de Informações Georreferenciadas (SIG); 7) Colaborar para um maior conhecimento do patrimônio espeleológico do PNSV e contribuir para o incremento do banco de dados das cavernas presentes em contexto local.Com a finalização do projeto, todos os objetivos alcançados pelo PROVIVAS mantiveram a excelência na qualidade proposta e atingiram a relevância esperada, tanto para a SEE, cujos membros(as) participantes puderam desfrutar de uma experiência enriquecedora no âmbito científico acadêmico e pessoal, quanto para o conhecimento e divulgação da potencialidade que o Patrimônio Espeleológico do Parque Nacional das Sempre Vivas possui em diversas formas.
Uma dessas formas é a promoção de uma produtividade sustentável e inclusiva, que vai desde a produção científica, buscando cada vez mais a compreensão da complexidade das dinâmicas ecossistêmicas e das gêneses existentes no local, até o desenvolvimento turístico, através dos atrativos de aventura como travessias e cachoeiras, além do potencial para iniciativas de educação utilizando-se dos atributos históricos culturais marcados, por exemplo, pela diversidade de pinturas rupestres e permanência das comunidades tradicionais.
Nesse sentido, o PROVIVAS incentiva e colabora com tal perspectiva, seja através da exploração e reconhecimento das áreas e seus constituintes, da disponibilização dos mapas produzidos e dados levantados, bem como através da divulgação em forma de artigos, relatos e produção audiovisual. Além disso, ao executar as atividades de forma participativa com as comunidades, buscando sempre espaço para diálogo, também contribui para uma aproximação sociedade-ciência, colocando em evidência o fazer espeleológico diante a realidade local.
Ainda, a partir dos estudos acerca da espeleogênese das cavidades do parque, contemplado a partir da parceria entre o Programa de Pós-Graduação em Evolução Crustal e Recursos Naturais do Departamento de Geologia (DEGEO) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), foi possível complementar o Plano de Manejo e também agregar conhecimento acerca do carste quartzítico.
Por fim, o Relatório Final traz um compilado de ações e atividades desenvolvidas e vivenciadas pelos sócios e sócias da SEE, e a eles e a elas é dedicado todos os produtos gerados dessa grande experiência e vivência que foi o PROVIVAS.
A SEE agradece aos funcionários do ICMBio (brigadistas, vigilantes, fiscais e administração do parque) pelo auxílio fundamental na logística de alojamento, comunicação e deslocamento dentro do Parque para realização das campanhas, bem como a identificação de alvos com potencial espeleológico e arqueológico. Às personalidades locais, em especial, aos moradores de Curimataí, Santa Rita e região, que estiveram juntos e dispostos ao acolhimento e suporte das equipes durante as expedições. Ao Programa Nacional de Conservação do Patrimônio Espeleológico do CECAV/ICMBio pelo suporte e parceria para execução da pesquisa. À Anglo American Minério de Ferro Brasil pelos recursos por meio do Termo de Compromisso de Compensação Espeleológica 03/2018 (TCCE). À Sociedade Excursionista e Espeleológica dos Alunos da Escola de Minas de Ouro Preto por apresentar e estimular o desenvolvimento do conhecimento espeleológico, seguindo sempre, desde 1937, mantendo a chama acesa.
Autoria do Texto: Beatriz Pires, Leandra Peixoto e Lorena Pires, 25 de outubro de 2024.
A escrita deste texto foi fundamentada no Relatório Final do Projeto, produzido por todos(as) os(as) colaboradores(as) da SEE que se envolveram e desenvolveram o projeto ao longo de sua execução: Alice Mendes dos Santos, Cassiano Emilio da Silva, Gabriel Amora Basílio, Gabriel Lourenço Carvalho de Oliveira, Guilherme Augusto Rodrigues de Souza, Guilherme Passos Ribas, Isaac Daniel Rudnitzki , Joaquim Irias Salgado Junior, José Mota Neto, Lara Chaves Carvalho Guerra, Leandra Peixoto Nolasco Selos, Luiza Clemente Rodrigues, Luiz Filipe Silva e Souza Leite, Marcos Paulo Sousa de Araujo, Mikhaela Saliveros Alderete, Paula de Freitas Moreira, Paulo Eduardo Santos Lima, Rafael Oliveira Silva, Ricardo do Couto e Silva Monteiro e Wendy Tanikawa Yoshizumi.
Referências bibliográficas:
Neto, J. M., Oliveira,G. L. C., Moreira, P. F., Sousa, G. A., Santos, A. M., Silva, C. E., Cruz, I. A., Rudnitzki, I. D. Caracterização do patrimônio espeleológico do parque nacional das Sempre Vivas (MG). Anais do 36 Congresso Brasileiro de Espeleologia, Brasília DF, SBE, 2022. p.253-259.
Yoshizumi, W. T. & Selos, L. P. N. Desvendando o Carste Quartzítico: Da vivência à compreensão da espeleogênese do Parque Nacional das Sempre Vivas. Espeleo-tema, Campinas, SP, v.31, n.1, 2024. p.18-39.
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